Entrevista com Cláudio Ferreira Lima – Resolução do CMN: "É um atentado à Constituição"

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O economista cearense Cláudio Ferreira foi entrevistado pela AFBNB no último dia 15 de janeiro para falar sobre a Resolução 4.452 do CMN que aumentou a taxa de juros dos fundos constitucionais. Para ele trata-se de uma “atentado à Constituição” e conclama a classe política à mobilização em torno do tema. Acompanhe:


AFBNB – O Conselho Monetário Nacional, por meio da Resolução Nº4.452 elevou a taxa de juros dos fundos constitucionais (FNO, FCO e FNE) para operações não rurais, medida que vale já a partir de janeiro de 2016. Como o senhor avalia a medida e que impactos pode causar, considerando os próprios fundos, as regiões em que são aplicados e os bancos que operam os mesmos?


Claudio Ferreira Lima – Eu considero antes de tudo um atentado à própria constituição, porque ao colocar na constituição, no artigo 159, os fundos constitucionais de financiamento, o constituinte estava ali criando condições diferenciadas para as regiões mais pobres  em termos de financiamento do desenvolvimento. Portanto, alterar essas condições, inclusive igualando, até indo além daquelas que vigoram nas outras regiões mais ricas, o governo está  exatamente produzindo esse “estupro” na Constituição. Esse é um lado da questão. O outro, vamos dizer, esse custo diferencial das operações dos fundos constitucionais nas regiões mais pobres significa um fator de competitividade importante para oferecer às empresas que já operam (já atuam, estão implantadas) e também como fator de competitividade para atrair novas empresas para a região. Com isso, os governos de estado dessas regiões estão perdendo um fator importante de competitividade, já que o financiamento é parcela importantíssima nesse processo. Eu estranhei a bancada do nordeste não ter se pronunciado de pronto com relação a isso e não tenha acompanhado de perto para evitar que essas medidas viessem a acontecer. Com isso, me deu muita saudade de Zezéu Ribeiro, de Pedro Eugênio, que eram líderes muito atentos a tudo que acontecia ou poderia vir a acontecer. Eu também espero dos outros governadores do estado (o do Ceará já se pronunciou) que eles atentem bem para esse fator de competitividade e como essas regiões estão perdendo essa medida de ajuste fiscal.


AFBNB – No âmbito do Nordeste e o conjunto da área de atuação do BNB, gestor do FNE, qual o impacto que a medida pode causar, considerando o papel que o Banco cumpre no contexto do desenvolvimento?


CFL – Isso, sem dúvidas, afeta o papel desenvolvimentista do Banco, que foi criado para oferecer essas condições diferenciadas para a economia da região pra que ela pudesse se desenvolver, de maneira que isso abala, sobretudo, a atuação do Banco, que vai oferecer um crédito com os custos tão elevados quanto os oferecidos em outras regiões. Naturalmente, quem tomou uma medida dessas praticamente está desconhecendo a questão regional no Brasil. Não está interessado nisso ou acha que essas regiões contam muito pouco nesse momento de ajuste fiscal. Assim, o Brasil se resume, vamos dizer, da Bahia pra baixo, pouco conta a região Nordeste, ela não foi levada em conta. Nem mesmo a própria existência dos Bancos regionais. Geralmente, quando se fala em banco público, geralmente só se fala em BNDES, Banco do Brasil e Caixa Econômica e aí você tem os bancos regionais que são sempre esquecidos. Isso para o Banco do Nordeste é um golpe muito grande. O BNB está administrando um crédito que não é para as condições do Nordeste, que devem ser diferenciadas para as regiões mais pobres do País.


AFBNB – Considerando a crescente demanda pelo crédito, inclusive com o anúncio pelo governo de buscar a ampliação por meio dos Bancos públicos, como o senhor analisa a decisão? Não configura como contraditório, uma vez que pode ocasionar retração?


CFL – Do ponto de vista do Estado você luta para atrair investimentos, porque a poupança na região, nos Estados mais pobres é pouca, então o governo procura fazer o trabalho de infra-estrutura, oferecer incentivos fiscais e isso ainda não é suficiente. Existem os incentivos regionais que são proporcionados pelo imposto de renda, que a Sudene ainda administra e existe também o financiamento que é o do FNE. Na medida em que você não tem isso como deveria ter há uma dificuldade em ampliar os investimentos na região.  Qual a empresa que vem pra cá para tomar crédito pagando até mais do que pagaria nas outras regiões mais ricas do País? Isso é um absurdo. Vai de encontro à política da diminuição das desigualdades regionais e vai de encontro à Constituição porque no artigo 3° você vê que é definido como um dos objetivos fundamentais da República a redução das desigualdades sociais e regionais. A Constituição não é vista por essa tecno-burocracia que elabora esse ajuste fiscal, é desconhecida, passam por cima da constituição. Por isso que acho que a AFBNB tem que entrar nessa luta, mostrar à sociedade esses absurdos que são cometidos contra o documento mais importante que existe que é a Constituição.


AFBNB – O senhor vislumbra perspectiva de reversão da medida? Que ações são necessárias para isso? Que atores devem ser envolvidos?


CFL – Sobre a medida foi tomada no âmbito do Conselho Monetário Nacional (eu) questiono essa legitimidade de tomar medidas ao ponto de ir contra à própria constituição do País . O mundo político tem que se manifestar, as bancadas, os governadores da regiões atingidas tem que tomar uma atitude forte com relação a essa medida e exigir que ela seja cancelada. Muito importante é sair para a ação política concreta e construir uma ação política consistente para poder com isso atacar essa política malsã que saiu da cabeça de técnicos que pouco estão se lixando (sic) para as  desigualdades regionais do País.


 


Source: Notícias – 400

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