Reforma deveria cobrar mais impostos dos ricos e menos dos pobres, dizem economistas

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Por ora, proposta de Paulo Guedes prevê apenas a criação de um imposto único, a partir da unificação entre PIS e Cofins

Promessa de campanha de Jair Bolsonaro, a Reforma Tributária começa a ganhar contornos dentro do governo. O ministro da Economia, Paulo Guedes, entregou ao Congresso Nacional, na tarde desta terça-feira (21), a proposta de criação de um imposto único, a Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), a partir da unificação entre PIS e Cofins, dois tributos federais que incidem sobre o consumo.

Por não incidir em tributações estaduais e municipais, a unificação de PIS/Cofins não demanda modificações na Constituição Federal, o que deve provocar uma tramitação mais ágil no Congresso Nacional. Isso estimulou o governo a fatiar a proposta.

Outros pontos, como a inclusão de outros impostos, como ICMS (estadual) e ISS (municipal), assim como mudanças no Imposto de Renda, devem ser abordados em uma segunda fase do projeto, que ainda não têm data para ser apresentada.

Para o economista Paulo Gil Introini, diretor do Instituto Justiça Fiscal e integrante dos Auditores Fiscais pela Democracia, não se começa uma reforma tributária reestruturante elevando a tributação sobre o consumo.

“Se tivesse sido proposto um aumento de impostos das altas rendas, o imposto sobre grandes fortunas, o imposto sobre a tributação de herança, aí a gente podia pensar em explicar o PIS/Cofins, mas reduzindo o peso do PIS/Cofins”, afirma o economista.

Introini defende uma contribuição social para o sistema em cima de tributação sobre altas rendas, o que fecharia a conta de contribuições necessárias para o Sistema de Seguridade Social. Quem ganha acima de R$ 60 mil por mês, por exemplo, pagaria 10% para a seguridade social.

Para o economista, a questão central não é o PIS/Cofins, mas o imposto sobre grandes fortunas. “Então qual seria a questão central de uma reforma tributária? Seria retornar a progressividade do Imposto de Renda como existia antes de 1988, como existia antes do governo Fernando Henrique Cardoso”, defende.

Da mesma maneira, para Grazielle David, assessora da Rede Latinoamericana de Justiça Fiscal (RLJF) a proposta do governo federal nem mesmo pode ser descrita como uma reforma tributária no sentido mais essencial do termo.

“São reformas de tributação sobre o consumo, o que é completamente insuficiente para resolver os problemas que nós temos no sistema tributário. O principal diagnóstico é que é extremamente regressivo e, sem mudar isso, não vai ter eficiência”, afirma David, que também é doutoranda em Desenvolvimento Econômico na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Para ela, a crise econômica intensifica pela pandemia de covid-19 de fato implica no aumento de tributos. “A questão é sobre quem? Deveria ser sobre quem tradicionalmente nunca contribuiu de fato e quem tem mais renda”, afirma.

Novo imposto atingirá diretamente o consumidor

Se aprovado pelos parlamentares, o tributo proposto por Guedes será aplicado a todos os setores e produtos, inclusive aqueles da cesta básica.

“O tributo que incide sobre bens e serviços eleva os preços da mercadoria, então tende a ser regressivo, porque aquela pessoa que ganha menos consome toda a sua renda”, afirma o economista Paulo Gil Introini, diretor do Instituto Justiça Fiscal e integrante dos Auditores Fiscais pela Democracia.

Segundo a proposta de Guedes o valor do imposto que varia hoje entre 3,65% e 9,25%, a depender do faturamento da empresa, passará a ter um valor único de cobrança fixo de 12%. Ao mesmo tempo, para as entidades financeiras, como bancos e seguradoras, o imposto manterá o valor de hoje, de 5,8%.

“É uma contradição muito grande. Vai redistribuir a carga tributária de uma forma um pouco mais perversa, na hora que você diminui a tributação dos bancos e aumenta a do setor de serviços, dos pequenos e médios”, aponta Introini.

Com um valor único de 12%, Introini defende que a proposta de Guedes desrespeita o princípio da seletividade do imposto previsto na Constituição Federal. Segundo esse princípio, produtos essenciais como cesta básica, energia elétrica e comunicações, devem ter um imposto menor ou até mesmo nenhum.  “Se tem um percentual só, não vai ter a seletividade”, aponta o economista.

Reforma Tributária Solidária

Em 2018, 42 especialistas estabeleceram um diagnóstico e formularam os principais pontos para a Reforma Tributária brasileira que ficou conhecida como “Reforma Tributária Solidária”. No livro, de mesmo nome, os pesquisadores afirmam que o “caráter regressivo é um dos determinantes da obscena distribuição da renda no Brasil”.

Ainda de acordo com o livro, em 2015, enquanto a arrecadação brasileira sobre renda e patrimônio foi de 29,6%, em média, no conjunto de países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi de 25,4%.

Ao mesmo tempo, quando o assunto é arrecadação sobre impostos indiretos, praticados em cima do consumo, o Brasil alcançou o percentual de 49,6%, enquanto os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 32%.

No Congresso Nacional, duas propostas prevêem algum tipo de reforma tributária, uma na Câmara dos Deputados (PEC 45) e outra no Senado Federal (PEC 110).

Segundo David, a primeira foi construída ao longo de anos e em diálogo com governadores, prefeitos, setor privado e o próprio legislativo. “Ainda que seja insuficiente, no sentido de simplificação de impostos sobre consumo, é a mais consolidada em termos de construção”. Nesse sentido, David analisa que o governo federal deveria se juntar com as propostas já existentes, em vez de trazer um projeto próprio com etapas desconhecidas.

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