Dólar e petróleo: o fim de uma hegemonia

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Por meio século, pela supremacia de sua moeda, EUA atrelaram a ela todas as transações com o “ouro negro”. Força resultante alimentou um novo colonialismo e suas guerras. Agora, diplomacia chinesa o desafia – e aponta alternativas reais

Por Tomás LeightonJosé Acevedo, no Nuso | Tradução: Rôney Rodrigues

Em 1974, o presidente Richard Nixon enfrentou uma crise do petróleo, inflação descontrolada, recessão e a quebra do mercado de ações. Isso, em certa medida, foi resultado da decisão que o próprio Nixon havia tomado em 1971, quando decidiu abandonar definitivamente o padrão-ouro e liberar a emissão de dólares independentemente das reservas de ouro depositadas, como garantia da moeda, em Fort Knox. A partir de então, a quantidade de dólares emitidos e em circulação não guarda nenhuma relação, nem proporção alguma, com as reservas de ouro em posse do Tesouro dos EUA. Em outras palavras, o dólar não é lastreado em ouro e, portanto, a maioria dos dólares em circulação não tem lastro algum. É o que no jargão comum é chamado de “papel de parede” e os economistas chamam de “moeda fiduciária”. Estima-se que, atualmente, as reservas auríferas em Fort Knox (avaliadas a preços de mercado) sejam equivalentes a cerca de 270 bilhões de dólares (na denominação estadunidense), enquanto os dólares em circulação mais os depósitos bancários em contas correntes e contas de poupança (M2) somam 21 trilhões de dólares da mesma denominação. Esses dados foram contabilizados pelo Tesouro dos EUA em 2023. Isso nos permite calcular que, para cada dólar lastreado em ouro, circulam no mundo 77 dólares não lastreados ou “fiduciários”.

Aqui começa a história que quero contar. Ciente da necessidade de dar novo suporte ao dólar, o presidente Nixon enviou, em julho de 1974, seu secretário de Estado Henry Kissinger e o subsecretário William Simon à Arábia Saudita, que chefiava a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), criada em 1960 em Bagdá.

Qual era a missão de Kissinger e Simon? O xá Reza Palevi do Irã era, naquela época, o aliado estratégico dos EUA na região do Golfo e em todo o Oriente Médio – e contava com o apoio e proteção militar dos EUA. O xá, que era persa e xiita, via com desconfiança o papel crescente da Casa Real Saudita, que era árabe e sunita, devido ao seu crescente envolvimento na produção e comercialização de petróleo. Por sua vez, o monarca saudita temia a superioridade militar do xá do Irã, que ameaçava a integridade territorial do seu país e a segurança dos membros da Casa Real Saudita.

A diferença entre os dois reinos era que Reza Palevi começou a ser hostilizado pelos clérigos devido a rápida “ocidentalização” que havia imposto à sociedade iraniana, enquanto o monarca saudita controlava com mãos de ferro sua sociedade e aumentava cada vez mais sua influência entre os países do Golfo sunita. Um estava em declínio; e o outro, emergindo.

Portanto, a missão de Kissinger, sugerida por ele mesmo, era oferecer um acordo estratégico ao monarca saudita, pelo qual as forças armadas dos EUA defenderiam a família real e o próprio reino, em sua integridade territorial, de qualquer ameaça regional ou extrarregional. A contrapartida que os EUA exigiam era que a Arábia Saudita, na qualidade de presidente da Opep, determinasse que todos os países-membros fossem obrigados a fixar o preço internacional do petróleo em dólares estadunidenses, impedindo todas as transações na área de petróleo, gás e outros combustíveis fossem realizadas em outra moeda que não o dólar.

O Acordo de Jeddah, assinado em julho de 1974, estabeleceu uma aliança estratégica de longo prazo entre os EUA e a Arábia Saudita, que perdura até hoje. Essa aliança, consagrada no acordo conhecido como Petrodólar, salvou as finanças dos EUA. Como o mundo todo precisava de petróleo, todos precisariam de dólares para comprá-lo. A enorme demanda por petrodólares que se seguiu ao Acordo de Jeddah tornou-se a espinha dorsal do dólar, substituindo “ouro metálico por ouro negro, o petróleo”.

O lastro para os novos dólares emitidos não era mais o ouro, mas a demanda gerada pela obrigação de denominar os contratos de compra e venda de petróleo e gás em dólares estadunidenses em escala mundial O mundo foi coberto de petrodólares que, pela magia do poder do capital financeiro, transformaram-se em dívida externa dos países em desenvolvimento e emergentes. Através dos bancos comerciais estadunidenses e europeus, aqueles dólares que os países petrolíferos depositavam no sistema financeiro eram reciclados e transformados em dívida externa, cujo peso no mundo periférico não tardaria em explodir.

Na América Latina, o problema da dívida explodiu, encabeçado pelo México em 1982. Entre 1989 e 1996, o Plano Brady, nos países que aderiram a ele, reestruturou a dívida transferindo-a dos bancos para milhares de detentores de títulos privados. No entanto, não foi possível evitar que na década de 1990 as crises se repetissem no México, Sudeste Asiático, Rússia, Brasil, Turquia e Argentina. Esta situação, agravada pela globalização financeira, persiste na maioria destes países, com as suas sucessivas renegociações e alargamentos.

Esta foi também a origem do excessivo emissismo dos EUA, que se tornou o maior devedor do mundo, alimentando um défice externo acumulado que ultrapassa o seu PIB, mas que lhe permitiu manter artificialmente a senhoriagem do dólar diante de todas as outras moedas.

A guerra da Ucrânia e o declínio do dólar

Apenas quatro semanas após a guerra na Ucrânia, o dono da Blackrock, Larry Fink, fez duas previsões que fizeram tremer os mercados internacionais. Ele afirmou: “A invasão russa da Ucrânia pôs fim à globalização que experimentamos nas últimas três décadas” e, antes que os jornalistas pudessem recuperar o fôlego, ele arrematou: “Um sistema global de pagamentos digitais, cuidadosamente projetado, pode melhorar a liquidação de transações internacionais (substituindo o dólar como padrão de câmbio para o comércio internacional), reduzindo o risco de lavagem de dinheiro e corrupção”.

As opiniões de Larry Fink nunca passam despercebidas, pois ele administra o maior fundo de investimentos do mundo e administra uma carteira de ativos de mais de 10 trilhões de dólares, ou seja, o equivalente a mais de 10% do PIB mundial. A leitura atenta de suas declarações revelou um alerta para as mudanças estruturais que a guerra europeia iria acelerar. Ele estava antecipando o declínio do uso do dólar como moeda hegemônica e a necessária transformação do sistema de pagamentos global.

A senhoriagem monetária do dólar no comércio internacional e como reserva de valor pode não acabar no curto prazo, mas sua falta de apoio e o privilégio dos EUA de emitir a moeda de troca universal começam a ser discutidos. O próprio Wall Street Journal deu prova concreta dessa virada ao publicar, por meio de seus correspondentes em Riad e Dubai, capital e centro financeiro da Arábia Saudita, que as negociações foram aceleradas para que a potência petroleira comece a vender barris de petróleo bruto para a China, recebendo yuans em vez de dólares. Esta seria a plataforma de projeção, em larga escala, do “petro-yuan” digital nas transferências crossborder, ou seja, nos pagamentos que são feitos entre diferentes fronteiras.

O que o The Wall Street Journal anunciou já aconteceu. Os números dessa troca não são pequenos. A Arábia Saudita exporta petróleo por cerca de 150 bilhões de dólares por ano e a China compra um terço desse total. O segundo país para o qual mais vende é a Índia, país que também tem interesse em desenvolver seu próprio sistema de moeda digital, que poderia ter liquidação em tempo real e compatibilidade com a rede digital yuan. Isso era completamente previsível, a economia chinesa responde por cerca de 20% do PIB mundial, mas sua moeda é usada em menos de 3% das trocas comerciais globais. Se o crescimento econômico e comercial da China continuar a crescer rapidamente, nas palavras de Ray Dalio, chefe de um dos maiores fundos de hedge do mundo: “O yuan desempenhará um papel cada vez mais importante como reserva de valor e mudança internacional. É natural”.

Irã, Arábia Saudita e China: triângulo de distensão

Em 10 de março de 2023, apenas um ano após o início do conflito russo-ucraniano, a República Islâmica do Irã e o Reino da Arábia Saudita, rivais (aparentemente irreconciliáveis) pela hegemonia na região do Golfo Pérsico, restabeleceram relações diplomáticas. Os passos dados a favor da distensão começaram em 2021, quando as partes concordaram em avançar em conversas secretas, a fim de resolver diferenças enraizadas em aspectos políticos, econômicos e religiosos. Mas o mais surpreendente no anúncio surpresa é que o acordo entre Teerã e Riad foi alcançado, por meio dos esforços diplomáticos da ascendente diplomacia da República Popular da China.

A pergunta inevitável é: o que provocou essa mudança na geopolítica daquela região? São várias as causas concomitantes que permitiram a resolução bem-sucedida do processo de paz:

Destaca-se o “papel de mediação” da China, que responde a vários fatores. a) Em primeiro lugar, ambos os países mantêm intensas relações comerciais com a China, particularmente no campo energético-petróleo; b) A partir de 2017, a China tornou-se o maior importador mundial de petróleo, superando os EUA; portanto, o petróleo bruto do Oriente Médio e dos países do Golfo é um insumo crítico para sustentar suas indústrias, produção e consumo. c) Um fato determinante: a Arábia Saudita é o maior exportador de petróleo bruto para a China, seguida pela Rússia, Irã em terceiro, depois Iraque, Omã, Angola e, em sétimo, os Emirados Árabes Unidos.

A ativa diplomacia pública e não pública desenvolvida pela China na região desde meados da década passada deu frutos. Destina-se a garantir o abastecimento adequado de petróleo bruto, ocupando os espaços de influência cedidos pelos EUA e garantindo as rotas de abastecimento através do Golfo Pérsico, Estreito de Ormuz e Golfo de Aden. Nesse sentido, o Irã aderiu oficialmente ao Projeto Rota da Seda Chinesa (OBOR/BRI). Por sua vez, a China é o principal parceiro comercial da Arábia Saudita e os investimentos chineses são valorizados no âmbito da chamada “Visão 2030 do Reino”, que consiste em atingir os seus objetivos de desenvolvimento. A distensão bilateral também serve para fortalecer as expectativas de um relacionamento mais aprofundado com a China, por parte dos membros do Conselho de Cooperação do Golfo. A Arábia Saudita também espera aderir ao projeto Rota da Seda na região de Jizan, a fim de atrair investimentos estrangeiros.

Do lado iraniano, as negociações com as potências ocidentais para reativar o pacto nuclear de 2015 (assinado pelo presidente Obama) estão congeladas e as sanções econômicas impostas por elas tornaram as relações mais tensas. Por outro lado, a Rússia, principal aliada internacional do Irã, está em guerra com a Ucrânia, conferindo à China um papel maior de mediador, ator diplomático e estratégico na região do Golfo.

Concretamente, por meio do Novo Acordo, os compromissos assumidos pelas partes reafirmam o respeito mútuo pela soberania, o princípio da não-ingerência e a reativação de um acordo de cooperação na questão de segurança, assinado em abril de 2001. Também concordaram em cooperar na luta contra o terrorismo, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, além de reativar um acordo comercial e tecnológico firmado em 1998.

Muitos observadores consideram importante analisar o papel desempenhado neste acordo pelo príncipe herdeiro Mohammed bin Salman (MBS), governante de fato do reino saudita, dada a idade avançada do seu pai, o rei Salman bin Abdulaziz, de 87 anos. De acordo com um observador, embora o governo Biden tenha maltratado seus aliados do Golfo, ameaçando transformar os sauditas em “párias do sistema” e restringindo o fornecimento de armas, o MBS encontrou mais pragmatismo na crescente diplomacia chinesa.

Segundo essa interpretação, o anúncio do reestabelecimento das relações diplomáticas entre Riad e Teerã não deveria ter surpreendido a Casa Branca, já que foi o resultado inevitável das limitações diplomáticas dos EUA, do relativo declínio de sua liderança, da guerra Rússia-Ucrânia e da busca da China em expandir sua influência como uma potência global.

Finalmente, a nota mais marcante do acordo saudita-iraniano é que o mediador foi Pequim, papel tradicionalmente exercido por Washington. O Financial Times alertou até que ponto as renovadas aspirações geopolíticas da China foram expostas. Ele observou que, durante anos, Pequim limitou sua atenção no Oriente Médio a questões econômicas e comerciais, sem se envolver no campo da política e da segurança. Os acontecimentos, verdadeiros mestres da história, parecem confirmar a tendência estrutural da época. A ponto de, no plano estratégico, em geografias distantes como a Ucrânia e o Golfo Pérsico, Pequim demonstrar uma vocação diplomática para a mediação e proteção global, condizente com sua condição de superpotência econômica mundial.

Desdolarização como tendência

Um dos efeitos globais da guerra na Ucrânia foi o aumento geral dos preços de alimentos e combustíveis, o que gerou taxas de inflação muito altas na maioria das economias e também nos EUA. Neste país, a queda do dólar e o crescimento de sua dívida são duas faces da mesma moeda. O dólar estadunidense perdeu 96% de seu valor desde que o Federal Reserve foi criado em 1913, enquanto os empréstimos públicos dispararam para mais de 120% de seu PIB. É por isso que o mundo está se “desdolarizando”. Muitos países estão reduzindo a incidência do dólar em suas reservas, optando por reservas de metais: ouro, em menor escala, prata e outros ativos denominados em diferentes moedas.

A estas causas econômicas, preexistentes à guerra, juntam-se as sanções contra a Rússia que a excluem do SWIFT como sistema internacional de pagamentos, impedindo a fluidez das suas transações com os países europeus, obrigando-a a reorientar o seu comércio para a Ásia, África e América Latina. A mesma tendência é observada na China que, como vimos, redireciona seu comércio para os países-membros do Conselho de Cooperação do Golfo, Oriente Médio, países da ASEAN, África e América Latina, espaços nos quais o yuan tenta se deslocar furtivamente para o dólar.

Uma recente reunião de Ministros de Finanças e Diretores de Bancos Centrais da ASEAN, realizada em 28 de março de 2023 na Indonésia, teve como tema central a redução da dependência do dólar, do euro, do iene e da libra esterlina para suas transações nacionais e entre países da região, substituindo-os pelas suas moedas nacionais. Isso significa que o sistema de pagamento transfronteiriço digital aprofundaria sua expansão e permitiria que os países da ASEAN usassem suas moedas para o comércio intra e extrarregional. Tal acordo de cooperação já havia sido alcançado entre Indonésia, Malásia, Cingapura, Filipinas e Tailândia em novembro de 2022. Além disso, o Banco Central da Indonésia preparou seu próprio sistema nacional de pagamentos como parte dessa tendência, conforme declarado em 27 de março de 2023.

O presidente da Indonésia, Joko Widodo, na mesma reunião, exortou as administrações regionais a estabelecerem a utilização de cartões de crédito emitidos por bancos locais e a cancelarem gradualmente os cartões internacionais como Visa e Mastercard e outros meios de pagamento ligados ao sistema de pagamentos do Ocidente. Ele argumentou que a Indonésia precisa proteger seu sistema financeiro de disrupções geopolíticas, citando como exemplo as sanções impostas à Rússia pelos EUA, UE e seus aliados após o conflito com a Ucrânia. Sair do sistema de pagamentos ocidental é necessário para proteger suas transações “de possíveis consequências geopolíticas”, disse Widodo. Na Ásia, apenas Cingapura aderiu às sanções contra a Rússia, os demais países continuam negociando com aquele país.

Na África, é notória a presença da China na maioria dos países do continente, através do financiamento e construção de obras de infraestruturas de transportes, energia e telecomunicações. A maioria dessas obras é financiada por meio de swaps, que geram correntes comerciais e fornecimento de commodities em yuan, como petróleo, gás, cobre, minerais e metais preciosos – ouro e diamantes – como contrapartida. Em duas décadas, de 2000 a 2020, a China investiu 160 bilhões de dólares na África, construiu 61 portos e 10 mil quilômetros de ferrovias, (equivalente à distância Buenos Aires-Madrid). O tipo de investimento é o Modelo Angola, grande exportador de petróleo, país no qual investiu 42,6 mil milhões de dólares. A China tem predileção pela África (o continente esquecido), o que preocupa as antigas metrópoles coloniais da Europa. Já Mao, na década de 70, havia financiado a construção da ferrovia entre Zâmbia e Tanzânia.

O avanço da China no comércio internacional tende a mudar o antigo modelo de intercâmbio entre os países. Também na América Latina onde quase todos os Estados têm a China como seu primeiro ou, em alguns casos, seu segundo parceiro comercial. O recente acordo entre o Brasil, o país líder da região, e a China estabelece que: o yuan e o real serão as moedas de troca do comércio bilateral. Isso significa que 150 bilhões de dólares deixaram de ser negociados em dólares, passando para yuans e reais. Este importante Acordo será formalizado durante a próxima visita de Lula a Xi Jinping, em Pequim [a viagem ocorreu em 12 de abril].

O Brasil havia adotado a mesma solução para seu intercâmbio comercial com a Argentina no âmbito do Mercosul. Vale ressaltar que os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) está caminhando para uma nova moeda que possa substituir o dólar estadunidense, a começar pelo uso de suas moedas locais.

Em suma, o crescimento exponencial do comércio chinês no mundo está deixando a moeda estadunidense, que era o árbitro do comércio desde 1944 (Bretton Woods) até hoje, com menos margem de manobra.

Exórdio

Caro e paciente leitor, espero ter cumprido minha promessa de vincular a atual guerra na Ucrânia com mudanças no sistema monetário e de pagamentos internacionais que tendem a acentuar o declínio do dólar no comércio internacional e o papel fundamental da China como uma nova potência de poder, comercial, tecnológica e política. Se fiz isso, o objetivo desta nota está cumprido.

Mas se você economiza ou tem ativos em dólares estadunidenses, eu me sentiria culpado por adicionar mais uma preocupação àquelas que você provavelmente já tem. Deixe-me dizer uma coisa: nunca pense no futuro pela perspectiva do medo. Em primeiro lugar, não se deve levar a sério o que afirma o Global Times ao dizer que : “A grande história nos diz que o declínio da hegemonia começa com sua moeda e a desdolarização é inevitável”. Nem mesmo quando acrescenta: “Se dois eixos da hegemonia dos EUA se deteriorarem – a primeira, a ausência do monopólio das armas nucleares e sua superioridade militar, e a segunda, a queda acelerada da posição do dólar como reserva de valor e troca – acabou a hegemonia”. Este, em todo caso, é um processo muito lento e arriscado, pelo qual o Reino Unido passou com sua condição hegemônica e sua moeda, a libra esterlina, de 1919 na Conferência de Versalhes a 1944 com os Acordos de Bretton Woods. É verdade que, como disse Buda, as coisas deste mundo são “impermanentes” e o que não acontece em um século, pode acontecer em três décadas.

Também é verdade que a “peregrinação europeia a Pequim” já começou. Primeiro, o presidente do governo espanhol, Pedro Sánchez, para apoiar a proposta de paz de 12 pontos para negociar a distensão entre a Rússia e a Ucrânia; a então presidente da Comissão Europeia Ursula von der Leyen, para mostrar a Xi Jinping a nova “Doutrina Europeia” sobre a China e, mais tarde, o presidente da França, Emmanuel Macron, para proclamar aos quatro ventos o lema de Charles De Gaulle: “A Europa tem ter uma política externa autônoma e um sistema de defesa coletiva diferenciado da OTAN, para não ser satélite dos EUA”. Para não ficar atrás, a América Latina, por meio da visita do presidente Lula da Silva, explicará a vocação de integração da região, sua adesão à multipolaridade mundial e seu plano de paz para a Rússia e a Ucrânia. Tudo isso é verdade, mas resta uma pergunta a ser respondida: o que os EUA vão fazer para preservar sua posição hegemonia política, econômica e monetária? Isso, como diria Rudyard Kipling, é assunto para outra história. Ou outro artigo. Eu vou te contar no próximo.

   

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