Entidades temem aumento de acidentes e mortes com MP que acaba com limite de horas e com descanso semanal
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Assinada pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL) no final de abril, a MP 881/19recebeu mais de cem emendas até agora, já foi aprovada na comissão mistado Congresso.
Entre outras atacas, a medida flexibiliza garantias legais como a marcação das horas trabalhadas, os registro de horas extras e os descanso semanal remunerado. Nas áreas rurais, mais do que no meio urbano, tais mudanças apontam para um cenário de precarização severa.
O projeto em votação permite que o patrão determine sequências de dias trabalhados, contemplando sábados, domingos e feriados sem o descanso semanal. Tal permissão pode aumentar os riscos de acidentes e mortes em períodos de colheita, que já exigem esforço redobrado dos trabalhadores.
Segundo o Anuário Estatístico do INSS, em 2017 os acidentes de trabalho provocaram 3.817 mortes no campo, além de causarem 8.083 afastamentos temporários e 13.265 aposentadorias por invalidez – totalizando 25.165 ocorrências.
“Como está proposto, [o projeto] pode resultar em jornadas muito longas, talvez até exaustivas, sendo o campo o local onde a atuação sindical e a fiscalização têm pouca presença. Aliado a esses fatores, há muita resistência ao cumprimento da legislação trabalhista. Lembrando ainda que, para o mundo rural, a proteção trabalhista e previdenciária sempre chegou atrasada”, analisa o auditor fiscal do trabalho Calisto Torres Neves, da Secretaria Regional do Trabalho do Rio Grande do Norte.
Êxodo
Existe ainda o temor de que a precarização leve a um aumento do êxodo rural, já que ter carteira assinada e garantia mínima de direitos trabalhistas é um dos fatores que influenciam a permanência do agricultor no campo.
Segundo dados da Pnad Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), em 2014 o país tinha 4 milhões de trabalhadores rurais assalariados, sendo apenas 1,6 milhão com carteira assinada. Em 2019, o total de assalariados no campo caiu para 3,4 milhões, sendo 1,5 milhão com carteira.
“Duas decisões nos governos Temer e Bolsonaro têm provocado o aumento da informalidade no campo. Uma é a reforma trabalhista e a outra é o fim do ministério do Trabalho. Isso possibilita que os empresários do agronegócio contratem a mão de obra da forma mais precarizada possível. Quanto maior a precarização e a informalidade os jovens são pressionados a deixar o campo e a buscar emprego na cidade”, disse Aristides Veras dos Santos, presidente da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura).
“É notório hoje o comportamento dos empregadores rurais em negociar com os trabalhadores, tendo como teto a lei, quando a lei é favorável ao empregador. Quem avançou ao longo dos anos conseguiu, quem não avançou não vai conseguir porque vai enfrentar problemas para ter algum direito de proteção dos trabalhadores e trabalhadoras”, completa José Manoel dos Santos, o Zezinho, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juazeiro (BA), na região do Vale do São Francisco.