Curta-metragem traz olhar sobre assentamento no interior de Mato Grosso e quer provocar debate sobre a produção de alimentos
“Para mim, essa é a semente do novo”, disse o escritor Leonardo Boff. “O ser humano não como dono, mas um filho, uma filha da terra. O futuro da humanidade vem da terra.”
Dirigido por Adriana Miranda, o filme de 15 minutos foi rodado no assentamento Roseli Nunes, trabalhadora rural assassinada em 1987, aos 33 anos, durante protesto no interior gaúcho. O assentamento fica no município de Mirassol D’Oeste, em Mato Grosso. Tem como “personagem” principal a assentada Miraci Pereira da Silva, que fala do trabalho e da importância de cuidar da terra e da semente. Dos grãos.
“As pessoas não têm essa preocupação com a semente crioula, nativa”, conta Miraci, em meio a imagens de pés descalços, mãos, terra. “É mais fácil ir lá no mercado comprar. (Mas) no segundo ano (a terra) já não produz mais, é muito dependente de veneno, de agrotóxico. (…) Esses grandes empresários não estão preocupados com a alimentação do seu país.”
Comida saudável, trabalho coletivo
Segundo a diretora do filme, Grão procura um olhar poético sobre a luta das famílias. “Homens e mulheres que, por meio da agroecologia, encontram o caminho da comida saudável, do trabalho coletivo e da vida em comunhão”, descreve. “Fui pela primeira vez em assentamentos e fiquei impressionada em como as coisas funcionam, em como ali não tem fome, em como tudo é coletivo, isso me reconectou com a questão da terra.”
Já exibido e premiado fora do país, o curta é dividido em três atos (Semente, Interconectividade e Luta). Traz, além das falas de Miraci e outros assentados, narração de trechos dos livros Poemas sem Terra (do escritor e cineasta Carlos Pronzato, argentino radicado no Brasil) e A Águia e a Galinha (Boff). A diretora volta a usar o termo conexão, para se referir à Mãe Terra e fundamentar a agroecologia. “Para que as pessoas acordem e para que a gente tenha um planeta habitável no futuro para os nossos filhos e para os nossos netos.”
Para Boff, a assentada fala de forma afetiva, como se a terra fosse um berço e gerasse vida. Ele e outros lembram da riqueza produtiva do país onde, ao mesmo tempo, milhões assam fome. E enfatiza a ação solidária dos sem-terra, ao distribuir alimentos desde o início da pandemia. Uma solidariedade que quase não se vê na sociedade, comenta, mas que mostra um “senso ético e político” dos assentamentos. “A humanidade só vai ter futuro se tratar a terra com esse afeto.”
Modelo “insano”
Dirigente nacional do MST, João Pedro Stédile, além de aspectos poéticos da obra, vê o documentário como “uma paulada no agronegócio”, uma denúncia às agressões do capital contra a natureza, uma crítica a um modelo “insano” de produção. “O agronegócio não funciona sem agrotóxico, e o agrotóxico mata. porque o solo é vivo”, afirma.
Segundo ele, ao longo dos anos o próprio MST evoluiu na sua visão sobre a natureza e a relação com a semente. “Só tem sentido ser agricultor se for pra produzir alimentos. E ele tem ser saudável. E alimento saudável só se produz com técnicas de agroecologia”, afirma.
O chat de lançamento pode ser visto aqui. Incluindo o filme, que começa aos aproximadamente 11 minutos de transmissão.
Brasil tem tudo para adotar a agroecologia como modelo na produção de alimentos