Apesar de enfraquecida pelo gigantesco bombardeio da mídia, é a resistência de parcela da sociedade brasileira que impediu até agora o governo ilegítimo de Temer de implementar a agenda neoliberal completa exigida pelo mercado financeiro que o colocou no poder com o golpe parlamentar-jurídico-midiático de 2016.
É uma guerra política e ideológica que está sendo travada em múltiplos campos e inúmeras trincheiras, que tende a se intensificar com a aproximação das eleições de outubro (se houver, uma vez que os golpistas não conseguem construir uma candidatura viável) e continuará depois, independentemente de quem se eleja.
Com legítimos representantes do mercado financeiro controlando o coração do governo (Meirelles na Fazenda e Ilan Itaú Goldfajn no Banco Central), os golpistas impuseram o corte de investimentos em políticas públicas por duas décadas, aprovaram a terceirização geral e irrestrita, destruíram a CLT e entregaram o pré-sal. Mas não conseguiram até agora aprovar a reforma da previdência, o santo graal dos liberais.
Há também enorme resistência da sociedade, principalmente dos movimentos sociais e sindical, contra a privatização pura e simples das empresas públicas. A estratégia do governo tem sido, então, a de comer pelas beiradas, adotando medidas que vão solapando continuamente o caráter público dessas instituições.
Peguemos o caso dos bancos públicos federais. Na crise financeira de 2008, quando os bancos privados fecharam as torneiras e encareceram o crédito, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, BNDES, BNB e Banco da Amazônia foram utilizados pelo governo como poderoso instrumento contracíclico. Ampliaram e baratearam a oferta de crédito, fomentando as políticas públicas e mantendo o mercado de consumo aquecido e gerando empregos.
Com essa atuação decisiva para amenizar o impacto da crise internacional sobre o Brasil e sustentar o desenvolvimento econômico e social, os bancos públicos federais ampliaram sua participação na oferta de crédito do conjunto do sistema financeiro, de 33,8% em 2007 para 56% em 2015. O governo golpista já reduziu essa participação em 3,6% em 2016 e 3,8% no ano passado.
A gestão Temer/Meirelles/Goldfajn até agora não obteve êxito em seu propósito de transformar a Caixa em uma S.A. e de reduzir a participação acionária do Tesouro no BB, mas saquearam R$ 100 bilhões do BNDES e impuseram demissões e reestruturações nas duas instituições que vêm reduzindo sua capilaridade no território nacional e, portanto, sua capacidade de levar crédito e desenvolvimento a todas regiões, notadamente nas regiões mais necessitadas.
Na segunda-feira 5 de março, o Valor Econômico publicou reportagem que, a despeito do viés liberal, admite que os “bancos públicos recuam e começam a retomar tamanho de antes da crise de 2008” e que “no ano passado as instituições oficiais perderam participação no crédito pela primeira vez em uma década”.
BB e Caixa, que juntos possuíam 5.005 agências no país em 2003, o que representava 29,8% do total do sistema financeiro, e ampliaram para 8.915 (38,6%) o número de estabelecimentos bancários em 2015, já fecharam 700 postos de atendimento nos últimos dois anos. No mesmo período, fecharam 19 mil postos de trabalho.
Na Caixa, o governo Temer privatizou a área de loterias e a seguradora. O BB divulgou nesta quarta-feira 7 edital de concurso para contratação de novos bancários, que pela primeira vez na história do banco não terão direito ao plano de saúde oferecido pela Caixa de Assistência (Cassi), começando a instituir assim uma subcategoria de funcionários em seus quadros de modo a facilitar a venda do banco.
É a lógica do desmonte contínuo, que em futuro próximo justificará a privatização, privando o Brasil de instrumentos estratégico de fomento do desenvolvimento econômico e social por meio da redução dos juros, da ampliação do financiamento habitacional, da agricultura, do saneamento, da mobilidade urbana, além da indústria e do comercio. Além de permitir sua instrumentalização para conter crises, como em 2008, e ampliar a bancarização e o acesso aos serviços bancários e ao crédito para a população de baixa renda.
Por outro lado, o sucateamento do BNDES para favorecer o mercado de capitais no financiamento da infraestrutura foi mais uma decepção na aposta de um governo ilegítimo e mentiroso. Segundo revela matéria do Valor Econômico de 1º de março (“Mercado de capitais falha em financiar infraestrutura”), muito pouco do que é investido no Brasil em infraestrutura é financiado pelo mercado de capitais. Essa situação, arrastada por anos, persiste mesmo após a retomada das emissões de dívida e da redução do BNDES.
Assim, os bancos públicos, que antes de tudo pertencem à sociedade brasileira e não ao governo de plantão, precisam de nossa resistência. E essa é uma tarefa de todos.