Artigo: Desafios da Fraternidade

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*Por ANFREDO ARAÚJO DE OLIVEIRA Professor de Filosofia da UFC

O diretor da revista La Civiltà Cattolica, Antonio Spadaro, resume assim o cerne da proposta de fraternidade do papa Francisco para o mundo: “A fraternidade é aquilo que permite que os iguais sejam pessoas diferentes. O ódio elimina o diferente. A fraternidade salva o tempo da política, da mediação, do encontro, da construção da sociedade civil, do cuidado. O fundamentalismo o anula em um videogame”. O papa afirma que a melhor maneira de dominar e avançar sem entraves é semear desânimo e despertar uma desconfiança constante. Hoje, com várias modalidades, nega-se a outros o direito de existir e pensar recorrendo à estratégia de ridicularizá-los, insinuar suspeitas e reprimi-los. Não se acolhe sua parte de verdade, seus valores e, dessa forma, a sociedade se empobrece e termina reduzida à prepotência do mais forte. A política deixou de ser um debate saudável sobre projetos a longo prazo para o desenvolvimento de todos e o bem comum, reduzindo-se a receitas efêmeras de marketing, cujo recurso mais eficaz é a destruição do outro.

Hoje, um projeto com grandes objetivos para o desenvolvimento de toda a humanidade aparece como um delírio numa sociedade voltada para os interesses individuais. No entanto, precisamos nos constituir como um “nós” que habita a Casa Comum. Esse cuidado não interessa aos poderes econômicos que precisam de ganho rápido. As vozes que se levantam em defesa do meio ambiente são frequentemente silenciadas ou ridicularizadas em nome da racionalidade que é um disfarce de interesses particulares. Em nossa cultura, vazia, fixada no imediato e sem projeto comum “é possível que, perante o esgotamento de alguns recursos, se vá criando um cenário favorável para novas guerras, disfarçadas sob nobres reivindicações” (LS n. 57).

O papa afirma que o Grande Imã Al-Tayyeb e ele não ignoram que avanços positivos se realizaram na ciência, na tecnologia, na medicina, na indústria e no bem-estar, especialmente nos países desenvolvidos, mas ressaltam que, juntamente com tais progressos históricos, grandes e bem avaliados, ocorre uma deterioração da ética, que condiciona a atividade internacional, com enfraquecimento dos valores espirituais e do sentido da responsabilidade de todos frente a essa situação. Tudo isso contribui para disseminar uma sensação geral de frustação, solidão e desespero.

Neste contexto emergem focos de tensão e se acumulam armas e munições numa situação mundial marcada pela incerteza, pela decepção e pelo medo do futuro, além de controlada por interesses econômicos míopes. Apontam igualmente para as graves crises políticas, a injustiça e a falta de distribuição equitativa dos recursos naturais. No mundo atual, enfraquecem os sentimentos de pertença à mesma humanidade e o sonho de construirmos juntos a justiça e a paz. Os movimentos digitais de ódio e destruição são meras associações contra um inimigo. No entanto, o isolamento e o fechamento em nós mesmos e em nossos interesses nunca serão o caminho para voltar a dar esperança e efetivar uma renovação, mas antes a proximidade, a cultura do encontro. Cultura do confronto não, cultura do encontro sim!

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