Taxar os super-ricos para combater a desigualdade social

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Reforma Tributária de Paulo Guedes beneficia banqueiros e não muda estrutura que penaliza os trabalhadores

Divulgação

Em Sorocaba, empresários pagam R$ 37 mil para estacionar jatinhos

Não importa qual parâmetro utilizar para contar a desigualdade social, o Brasil sempre figurará entre os mais desiguais do mundo. Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) para 2018, o Brasil é o 7º país com o maior coeficiente de Gini, que mede o nível de desigualdade. Se considerarmos a concentração de renda entre o 1% mais rico, no Brasil, esta população concentra 28,3% de toda a renda do país, apenas atrás do Catar – um país absolutista com poder hereditário.

Tabela 1 – Ranking dos países com maior coeficiente de Gini e maior concentração de renda no 1% mais rico

Fonte: Pnud

Sabemos que o primeiro gerador de desigualdades é o fato de que alguns recebem salários (geralmente baixos) pelo seu trabalho e outros recebem lucro e renda (geralmente elevados) pelo trabalho dos outros. Mas isto não explica toda a desigualdade.

Há mais determinações. No Brasil, a principal razão de fundo são os longos quatro séculos de escravização de negros e negras e o racismo estrutural legado por eles, que perdura na atualidade. Para compreender essa realidade, basta notar que os trabalhadores negros ganham menos da metade que um homem branco. Uma mulher negra trabalha o dobro que trabalha um homem branco e recebe menos da metade do que ele ganha.

Há outras também outras determinações, como a herança patrimonial, o machismo, a LGBTfobia etc., que se entrelaçam em questões sociais muito complexas.

Mas neste editorial queremos falar de algo em particular, de como o Estado intensifica estas desigualdades a partir do seu sistema tributário injusto e como a Reforma Tributária que defendemos visa combater isso.

No Brasil, quanto mais dinheiro você tiver menos imposto você paga. Segundo pesquisa publicada pelo Ipea, os 10% mais ricos no país pagam um total de tributos de 21% se comparada a sua renda, enquanto que os 10% mais pobres pagam o equivalente a 32%.

Gráfico 1 – Tributo pago em relação a renda por quadril de maiores rendimentos
1º decil representa os 10% mais pobres e o 10º decil os 10% mais ricos

Fonte: Ipea. Equidade fiscal no Brasil: impactos distributivos da tributação e do gasto social. Comunicado do Ipea nº 92, maio de 2011

Este Robin Hood às avessas ocorre justamente por a estrutura tributária brasileira ser regressiva. Apesar de o Brasil ter uma carga tributária abaixo da média da OCDE – 32,3% do PIB, enquanto que a média da OCDE é de 34,2% – o país tributa de forma injusta. Primeiro, o Brasil tem um peso excessivo dos tributos concentrados no consumo. Nós pagamos impostos embutidos no preço quando compramos uma caixa de leite ou um computador, quando cortamos o cabelo ou andamos de ônibus. Segundo a Receita Federal, o Brasil tem uma carga tributária de cerca de 14,3% em bens e consumos, o que o deixaria em 4º lugar dentre os países da OCDE que mais cobram tributos sobre bens e serviços, 3,2 pontos percentuais acima da média.

Por outro lado, o Brasil é o 6º país que menos cobra tributos sobre renda, lucro e ganho de capital, dentre 34 países que compõem a referida pesquisa. O Brasil também está muito abaixo da média quando se fala em carga tributária sobre a propriedade. Em síntese, o Brasil tributa muito o consumo e tributa pouco a renda e a riqueza.

O primeiro problema derivado disto é que ao se tributar consumo você não diferencia a renda do indivíduo, cobrando o mesmo imposto no feijão para o pobre e para o rico. O segundo é que quanto mais rico for uma pessoa, mais ela poupa, evitando que esta parcela da renda seja devidamente tributada. O terceiro, ainda sobre a tributação da renda, é que no Brasil não se cobra imposto de renda sobre dividendos (lucro apropriado por pessoa física), o que aumenta ainda mais o fosso entre empregadores e assalariados, burgueses e trabalhadores. Quarto, se cobra pouco de quem tem riqueza. Riqueza (que é diferente de renda) é um imóvel, ações de empresas e outros tipos de ativos. Elas são detidas por poucas pessoas, pois quanto menor a renda menor a chance de acumular imóveis ou empresas.

Por uma reforma tributária progressiva: maior taxação sobre os super-ricos e menor para os trabalhadores e mais pobres

Para grandes empresários, Paulo Guedes e partidos como o DEM, MDB, PP e PSDB, o problema da tributação no Brasil é outro: a sua “complexidade” e afagos para setores específicos (uma má distribuição entre os setores). O problema é que o Brasil é o país em que os grandes empresários mais tempo passam para cobrar imposto, ou que serviços pagam menos impostos do que a Indústria.

Justamente por isto, no projeto do governo Bolsonaro a Reforma Tributária se limita a propostas como a fusão de impostos como PIS e Cofins, a criação de um imposto único de valor adicionado substituindo todos os outros tributos (inclusive desvinculando de financiamentos como o da Seguridade Social). A Reforma de Paulo Guedes, em discussão no Congresso, preserva a estrutura tributária perversa e injusta, que beneficia os banqueiros, grandes empresários e os bilionários.

Nenhum projeto de Reforma Tributária da direita se propõe a tocar nas injustiças sociais, a combater um dos mais horrendos privilégios gerados pelo Estado brasileiro, o de cobrar mais imposto quanto mais pobre você for.

Por isto é fundamental que lutemos por uma Reforma Tributária progressiva, que seja solidária. É necessário tributar mais a alta renda, com aumentos de alíquotas no imposto de renda para os mais ricos e aumento da isenção na base da pirâmide. É necessário voltar a cobrar imposto de renda sobre dividendos. É urgente regulamentar a taxação sobre grandes fortunas e aumentar a tributação sobre heranças. E, por fim, criar uma taxação emergencial para bancos, a fim de financiarmos o combate à pandemia.

Esta reforma deve servir como um mix de aumento na arrecadação (em cima dos ricos) para financiar os serviços públicos (fundamentais para diminuir as desigualdades) e também para diminuir o peso dos tributos em cima da classe trabalhadora e dos mais pobres. Isto servirá para aumentar a possibilidade de consumo das pessoas com menor renda e erguer um Estado que sirva para a grande maioria dos brasileiros, e não para o 1% privilegiado da sociedade. E não um Estado que chancele as desigualdades em um país onde 42 bilionários aumentaram sua riqueza em US$ 34 bilhões em meio a maior pandemia e maior crise econômica da história.

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