A desigualdade de gênero em três gráficos reveladores

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Três metas da ONU – fim da mortalidade materna e da violência de gênero, e acesso ao planejamento familiar – parecem distantes. Brasil contribui para o pessimismo, inclusive no quesito pouco debatido dos casamentos infantis

Ao que o ano de 2030 se aproxima, o mundo se encaminha para avaliar quão perto está das metas da Organização das Nações Unidas (ONU) para reduzir as desigualdades de gênero. Na 66º sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher, também da ONU, que será realizada entre os dias 14 e 25 de março, serão revisados três objetivos, estabelecidos em 1996 na conferência de Pequim. São eles: o fim da mortalidade materna, da falta de acessibilidade ao planejamento familiar e da violência de gênero – que inclui casamento infantil, mutilação genital e violência doméstica. Um primeiro exame foi publicado na nova edição do boletim do Centro de Relações Internacionais (CRIS) da Fiocruz.

Os gráficos, produzidos pelo Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), não trazem tão boas notícias. Embora seja necessário reconhecer que todas as taxas estão em queda, parece que o mundo está distante de alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável propostos pela ONU. Mas, ao olhar o copo meio cheio, constataremos que houve uma queda consistente de mortes maternas entre 1990 e 2015, como mostra o gráfico abaixo. Em 90 eram 385 por 100 mil, hoje a taxa global é de 211 mortes por 100 mil nascidos vivos – e até 2030 é preciso que esse número chegue ao menos aos 70. Há dados para acreditar, no entanto, que a pandemia de covid tenha desacelerado essa queda: a doença é mais perigosa às gestantes e muitas das que foram contaminadas não conseguiram atendimento médico eficaz.

No Brasil, os números da mortalidade materna também são alarmantes: país concentra 75% das mortes de grávidas e puérperas por covid, no mundo – e as negras morrem 77% a mais. A taxa de morte materna, por aqui, está em 59,1 mortes por 100 mil nascidos vivos, ficando bem atrás do índice recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que seria menor que 20. “No Brasil, de 1996 a 2018, foram registrados 38.919 óbitos maternos no SIM [Sistema de Informação Sobre Mortalidade], sendo que aproximadamente 67% decorreram de causas obstétricas diretas”, reporta um relatório publicado pelo Instituto Federal de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente (IFF), da Fiocruz. Uma das principais causas da morte de gestantes é o aborto, quando feito de maneira insegura – dado considerado subestimado, já que a prática é criminalizada no Brasil.

Em termos de violência doméstica, a meta da UNFPA é que os números cheguem a zero até 2030. Não parece ser algo possível de se alcançar, e os números brasileiros ajudam a inflar o pessimismo. Em 2020, foram feitas 694.131 ligações de emergência para pedir socorro por violência doméstica – uma por minuto. Com a pandemia, o número de casos de feminicídio escalou. Segundo o Datafolha, 48,8% das mulheres que relataram ter sido vítimas de violência, entre 2020 e 21, foram agredidas dentro de casa.

Há outro dado que o UNFPA considera violência contra mulheres: o casamento infantil – considerado uma violação de direitos humanos que afeta principalmente as meninas. Embora em queda suave, a porcentagem de garotas em união formal ou informal antes dos 15 anos era de 7,5%, em 2015, conforme explicita o gráfico abaixo. A ideia é que chegue também a zero, em 2030.

Embora seja um problema pouco debatido por aqui, o Brasil está em quarto lugar em números totais de casamentos de pessoas abaixo dos 18 anos no mundo. Mais de 65 mil meninas se casam entre 10 e 14 anos de idade. É uma violência que afeta principalmente aquelas em vulnerabilidade social: muitas vezes o casamento é visto como maneira de se livrar de um ambiente familiar abusivo. E é outra mazela que piorou com a pandemia.

Falando em família… A outra meta da UNFPA diz respeito ao acesso a planejamento familiar. Até 2017, 11,5% das mulheres no mundo haviam passado por necessidade de uso de métodos contraceptivos que não foi atendida. No Brasil, a Atenção Básica do SUS disponibiliza contraceptivos para a população, como métodos hormonais, inserção de DIU e distribuição gratuita de camisinhas. Mas mesmo isso pode estar sob ataque, com um ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos que já considerou estimular a política do “eu escolhi esperar” para prevenir gravidez na adolescência…

   

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