Entidades se mobilizam contra a privatização do saneamento

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Nesta semana, o Senado pode votar o projeto que permite a privatização do saneamento básico, o que pode comprometer o acesso da população ao serviço essencial

 

Em plena pandemia da Covid-19, com o país tendo registrado mais de 1 milhão de casos da doença, o governo Bolsonaro segue firme com seus projetos de privatização e avança contra uma área importante para saúde pública: o saneamento básico. O governo e os senadores da “ala privatista” articulam para esta semana a votação em plenário do Projeto de Lei (PL) 4162/2019, que define o marco regulatório e facilita a transferência de estatais do setor para agentes privados. Nesta segunda-feira (22), 28 entidades de representação nacional e internacional realizam o Dia Nacional de Luta em Defesa do Saneamento Público.

O PL 4162 foi aprovado pela Câmara dos Deputados em dezembro de 2019 e caso seja aprovado pelo Senado sem alterações vai direto à sanção presidencial e vira lei. Com isso, haverá grande desestruturação do setor de saneamento, inclusive com a geração de demissões nas companhias estaduais e municipais de saneamento, segundo avaliação dos sindicatos que representam os trabalhadores dessas empresas.

O projeto de Lei privilegia empresas privadas ao não exigir delas o que exige das públicas, que terão de se virar com recursos próprios e cumprir até 2033 a meta de 99% de cobertura de água e 90% do esgoto, considerada impraticável, sobretudo com as restrições na obtenção de recursos federais. Já as empresas particulares poderão contar com o financiamento federal e não terão as mesmas obrigações.

A defesa do financiamento público para universalizar o acesso da população ao saneamento é defendida Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae). “Nós temos feito a defesa da Caixa 100% pública porque sabemos da importância do banco como agente de políticas públicas e parceira estratégica do Estado. O saneamento é uma das áreas em que o banco tem atuado de forma a promover melhoria das condições de saúde e da qualidade de vida da população”, explica o presidente da entidade, Sergio Takemoto.

Segundo dados do balanço do banco, as operações com saneamento e infraestrutura apresentaram evolução de 1,2% em 12 meses, totalizando R$84,7 bilhões em março de 2020. A Caixa informa que aumentou o volume de  empréstimos  para  os Estados  e  Municípios  através  do Financiamento à Infraestrutura e Saneamento Ambiental (FINISA) e os financiamentos com recursos do FGTS. O limite, aberto no dia 2 de março  desse ano, resultou em R$ 3,7 bilhões em contratações para 216 tomadores espalhados por todas as regiões do país.

Para o presidente da Federação Nacional dos Urbanitários, entidade que reúne trabalhadores dos setores de energia, saneamento, meio ambiente e gás, apesar dos números divulgados pela Caixa, os investimentos em saneamento tem sofrido redução nos últimos quatros anos. “O Governo acabou com o Ministério da Cidades e a Secretaria Nacional de Saneamento virou mero objeto de decoração do Ministério do Desenvolvimento Regional. Faltam mais recursos e políticas para o setor”, denuncia Pedro Blois.

Conforme o representante da FNU, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já está com vários projetos engatilhados para promover a privatização dos serviços em estados como Acre, Amapá, Alagoas, Rio de Janeiro, dentre outros. “O governo através do ministro Paulo Guedes quer impor a privatização como se fosse resolver o problema do País e nós somos contrários, ainda mais no momento como o que estamos vivendo em que o serviço se tornou ainda mais essencial”, ressalta o presidente da FNU.

O representante dos urbanitários critica o uso inadequado do BNDES para favorecer a iniciativa privada.  Segundo ele, ao invés de financiar projetos que visam a transferência de serviços públicos essenciais à população para iniciativa privada, o banco deveria fazer investimentos nas empresas públicas que não estão conseguindo empréstimos para implementar melhorias no sistema.

Jair Ferreira, diretor da Fenae, lembra que no governo Fernando Henrique Cardoso foram privatizadas algumas empresas de água e saneamento e o resultado foi desastroso. Não houve melhoria na qualidade da prestação de serviços e as tarifas aumentaram. “Privatizar não é a solução como o governo tenta passar para a população. O saneamento é questão de saúde pública e é papel do Estado assegurar o acesso a esse bem. Não podemos tratar essa questão sob a ótica o lucro”, alerta.

A Fenae  integra o Fórum Nacional de Reforma Urbana (FNRU), uma congregação de entidades e organizações não-governamentais criada no final da década de 80 para lutar pela reforma urbana, com iniciativas em defesa do acesso à moradia, saneamento, mobilidade, dentre outros temas.

Na contramão

Enquanto no Brasil o governo Federal e o Congresso atuam para privatizar o saneamento básico, em outros países está acontecendo exatamente o contrário: o serviço está sendo reestatizado. O Centro de Estudos em Democracia e Sustentabilidade do Transnational Institute (TNI), sediado na Holanda, mapeou serviços privatizados que foram devolvidos ao controle público em todo o mundo entre os anos de 2000 e 2017.

São casos de concessões não renovadas, contratos rompidos ou empresas compradas de volta, em sua grande maioria de serviços essenciais como distribuição de água, energia, transporte público e coleta de lixo. Segundo o instituto o processo de reestatização ocorreu porque as empresas privadas priorizavam o lucro e os serviços estavam caros e ruins.

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