Por um tratado global contra o lixo plástico

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Negociadores de 193 países vão se reunir em Nairóbi, no Quênia, para tentar conter a inundação dos oceanos por produtos químicos nocivos. Também pretendem ampliar as notificações dos descartes e a atividade de reciclagem, que alcança menos de 10% dos materiais

A cada ano, o consumo cego e o gerenciamento insuficiente de resíduos resultam no despejo de cerca de 11 milhões de toneladas de plástico nos oceanos – valor equivalente a um grande navio de carga por dia, todos os dias do ano. Esforços internacionais para reduzir o lixo marinho e a exposição natural a produtos químicos nocivos incluem, hoje, apenas algumas medidas específicas. Para enfrentar esse problema, já antigo, negociadores de 193 países irão se reunir em Nairóbi, no Quênia, na próxima semana, e criar um comitê de negociação para elaborar o primeiro documento global destinado a lidar com a situação.

Segundo a matéria publicada na revista Science, uma proposta já divulgada, e que foi desenhada durante a COP-26, determina que cada nação adote planos de ação, estabeleça metas e crie um sistema de monitoramento para alimentar um futuro órgão consultivo científico, em âmbito global. Criar essa abordagem mais ampla, diz Anja Brandon, analista de políticas da Ocean Conservancy, “será um esforço científico muito maior”. Isso porque um dos principais entraves é resolver uma lacuna de dados em larga escala. Números comparáveis entre países, por exemplo, e fontes mais robustas, estão em falta. Grupos sem fins lucrativos e agências governamentais usam dezenas de protocolos variados para levantamento de lixo na praia. O mesmo ocorre com os métodos de contagem de microplástico na água.

Uma das primeiras atribuições desse acordo internacional seria, por exemplo, definir um método padrão de contabilidade. Uma dessas abordagens, chamada de contabilidade econômica ambiental, já está sendo usada em alguns países para rastrear várias matérias-primas. Consiste em rastrear a quantidade de material que entra e sai das linhas de produção, e promete quantificar a quantidade de plástico reciclado usado em novos produtos. E para coletar e reunir esses dados, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que sedia o próximo encontro, tem trabalhado para aumentar a capacidade de monitoramento com programas de treinamento e cursos online.

Outra grande contribuição poderia vir das indústrias, com dados detalhados sobre produção, transporte e consumo de plástico. Mas muitos países permitem que as empresas mantenham essas informações confidenciais – o que dificulta o cálculo de como o plástico está se movendo na economia e no meio ambiente. E os negociadores enfrentarão uma questão-chave: qual o limite da produção de plástico, e até que ponto ele pode ser considerado nocivo? Que é péssimo ao meio ambiente e a biodiversidade, já é quase um consenso. Mas analistas acreditam que as negociações terão mais força e vontade política quanto maior a comprovação de que o plástico pode prejudicar muito a saúde humana.

Além de, claro, focar cada vez mais em construir maneiras de reutilizar os materiais plásticos descartados: atualmente, os pesquisadores estimam que menos de 10% dos produtos plásticos são reciclados. E qualquer acordo dificilmente exigirá limites para o plástico não proveniente da reciclagem.

A avaliação de Karen Raubenheimer, pesquisadora da Universidade de Wollongong, na Austrália, é que muitos usos para o plástico são vistos como essenciais, como aqueles usados na área da saúde, e que geram o descarte do lixo hospitalar. E isso é um problema enorme: conforme mostrou há algumas edições o Outra Saúde, a OMS estimou que, entre março de 2020 e novembro de 2021, 87 mil toneladas de equipamentos de proteção individual (máscaras, luvas, viseiras faciais) foram enviadas para apoiar os países durante a crise – sem contar o descarte de testes e materiais envolvidos nas vacinas.

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